
Na quarta‑feira (8 de outubro), GAECO/MPRS deflagrou a segunda fase da Operação El Patron, cumprindo seis mandados de prisão preventiva e onze de busca e apreensão em Pelotas, Charqueadas e Porto Alegre. A ação mirou o núcleo financeiro de uma facção criminosa que, segundo a investigação, movimentou mais de R$ 49 milhões entre maio 2022 e agosto 2024, usando lavagem de dinheiro, agiotagem e um aplicativo próprio para gerir os lucros ilícitos.
Contexto da Operação e o papel do Ministério Público
O Rogério Meirelles Caldas, promotor de Justiça e coordenador do 10º Núcleo Regional do Ministério Público do Rio Grande do Sul, explicou que a primeira fase da Operação, iniciada em 2023, já havia identificado dezenas de laranjas e empresas de fachada. "Esta segunda parte da investigação foi essencial para identificar os principais operadores do esquema", afirmou Caldas.
Segundo o próprio Ministério Público, a rede utilizava contratos falsos, notas fiscais simuladas e até mesmo um aplicativo mobile desenvolvido para registrar entradas e saídas de dinheiro, simulando um sistema bancário legítimo. O uso da tecnologia indica um grau de sofisticação que vai além das práticas típicas de pequenos grupos criminosos.
Detalhes da segunda fase: prisões, buscas e apreensões
Em Pelotas, foram cumpridos cinco mandados de busca e dois de prisão preventiva; em Charqueadas, cinco buscas e três prisões; e em Porto Alegre, um de cada. As delegações atuaram simultaneamente, invadindo residências, salas comerciais que serviam de fachada e até unidades prisionais onde alguns investigados já estavam detidos.
- Documentos financeiros: extratos bancários, planilhas e contratos falsos;
- Aparelhos eletrônicos: smartphones, tablets e dois laptops contendo o aplicativo de gestão;
- Veículos de luxo: três carros avaliados em mais de R$ 1,2 milhão, incompatíveis com a renda declarada.
Os bens apreendidos servirão como prova para o futuro processo de confisco de patrimônio, ainda que muitos ainda estejam em nome de terceiros – as famosas "laranjas".
Reações dos investigados e da comunidade
Alguns dos suspeitos, ainda não identificados publicamente, negaram as acusações e alegaram que os documentos foram obtidos de forma ilícita. Já o defensor público de um dos presos destacou que "a defesa vai analisar minuciosamente cada item apreendido, pois a simples presença de bens de alto valor não comprova crime sem a devida cadeia de custódia".
Na região de Pelotas, líderes comunitários expressaram alívio. "Há tempos, a gente via preços inflacionados nos comércios locais, suspeitando de algo errado. Essa ação traz esperança de que a justiça volte a ser feita", comentou o presidente da Associação Comercial de Pelotas.

Impacto econômico e análise especializada
Especialistas em criminalidade financeira apontam que a movimentação de R$ 49 milhões em apenas dois anos pode ter influenciado o mercado de crédito informal da região. Segundo a economista Ana Lúcia Mendes, "a agiotagem alimenta um ciclo de endividamento que aprisiona famílias de baixa renda, reduzindo a circulação de recursos na economia formal".
O uso de um aplicativo próprio também sugere que grupos criminosos estão se apropriadamente do modelo fintech, criando wei‑wallets paralelas para driblar o controle estatal. "É o que chamamos de "FinTech preta", que imita as funcionalidades de um banco, mas com o único objetivo de lavar dinheiro", completa Mendes.
Próximos passos e desdobramentos judiciais
A justiça já aceitou a denúncia contra 13 investigados, permitindo a execução das medidas cautelares. O próximo marco será a audiência de instrução, prevista para meados de novembro, onde serão apresentadas as provas obtidas nas buscas. Caso o juiz mantenha as prisões preventivas, a expectativa é que o processo de confisco de bens seja iniciado ainda em 2025.
O GAECO/MPRS informou que continuará monitorando as contas bancárias associadas às empresas de fachada, para evitar que os recursos sejam realocados para outras regiões do país.

Histórico da facção e a evolução da lavagem de dinheiro no RS
A facção investigada tem raízes que remontam ao início da década de 2010, quando começou a operar principalmente com empréstimos informais (agiotagem) em cidades do interior. Com o tempo, expandiu-se para a organização de rifas ilegais, que serviam como ‘cobertura’ para movimentar grandes quantias sem levantar suspeitas.
Ao longo dos últimos cinco anos, os órgãos de segurança estatal intensificaram o combate a essa modalidade de crime. A criação da GAECO – Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado – representou um ponto de virada, permitindo a integração de investigações financeiras, tecnológicas e de inteligência de campo.
Hoje, a Operação El Patron é considerada uma das maiores apreensões de recursos provenientes de lavagem de dinheiro no Rio Grande do Sul, servindo de precedente para futuras ações contra esquemas ainda mais sofisticados.
Perguntas Frequentes
Como a operação afeta a comunidade de Pelotas?
A ação interrompeu a principal fonte de agiotagem da região, reduzindo a oferta de crédito informal que costumava cobrar juros abusivos. Isso pode melhorar o acesso a empréstimos nas instituições formais e reduzir a vulnerabilidade financeira das famílias de baixa renda.
Quantas pessoas foram realmente presas?
Seis mandados de prisão preventiva foram cumpridos – dois em Pelotas, três em Charqueadas e um em Porto Alegre. A investigação aponta ainda 13 indícios de participação, que poderão levar a novas prisões conforme o processo avança.
Qual o papel do aplicativo usado pela facção?
O software funcionava como um gestor de fluxo de caixa, registrando entradas de dinheiro ilícito, distribuindo pagamentos a laranjas e gerando relatórios que imitavam operações bancárias regulares, dificultando a detecção pelas autoridades.
O que acontece com os bens apreendidos?
Os bens permanecerão sob custódia judicial até que o juiz decida sobre o confisco. Caso seja comprovada a origem ilícita, os veículos, eletrônicos e documentos serão leiloados, com os recursos revertidos ao erário.
Quais são os próximos passos do Ministério Público?
A próxima etapa é a audiência de instrução, prevista para novembro, onde serão apresentadas as provas coletadas. Se o juiz mantiver as prisões preventivas, o caso avançará para julgamento, podendo culminar em sentenças de longo prazo e confisco de patrimônio.
Wellington silva
outubro 9, 2025 AT 00:48Vê‑se que o combate ao dinheiro sujo exige mais do que força bruta; trata‑se de desmontar estruturas de fluxo que se assemelham a redes neurais financeiras. Quando o Estado intercepta tabelas de laranjas, está, na verdade, removendo nós críticos de um grafo de legitimidade ilícita. Essa operação mostra que a inteligência de dados pode ser tão decisiva quanto as batidas de campo. Não basta apreender veículos, é preciso rastrear a origem dos contratos falsos e das notas simuladas. Assim, a justiça tem a chance de criar um precedente de desmantelamento sistêmico.